ÉTICA, ESTÉTICA E EDUCAÇÃO AMBIENTAL

on quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Mauro Grün


Analisar a possibilidade de desenvolvimento de uma nova conexão entre ética, estética e Educação Ambiental na qual a Natureza se apresenta como parceira dominante.


JUSTIFICATIVA:
Ainda são poucas as abordagens mais filosóficas dos problemas ambientais no Brasil. Entre os principais podemos encontrar Grün (2007 a, 2007b), Pelizzoli (2004) e Junger (2004). Grün (2007 a) tem se dedicado a criticar a concepção objetivista de ciência moderna e, recentemente à estética (Grün, 2006),utilizando para isto a hermenêutica de Gadamer. Já Pelizzoli (2004) trabalha com a fenomenologia de Husserl, Heidegger e Levinas.
Em outra direção, mas também com abordagens filosóficas situa-se Nalini (2003) que tem preocupações éticas com a qualidade dos ambientes urbanos. E Junger (2004), por sua vez, trabalha o modo através do qual as transformações socioeconômicas afetam ambientes humanos e a saúde coletiva (Griffith, 2009 a,b). Recentemente, o Ministério da Educação, através da Coordenadora de Educação Ambiental no Brasil, Rachel Trajber, encomendou o livro "Pensar o ambiente: as bases filosóficas da Educação Ambiental". Além de ser um dos organizadores da coletânea, tive a oportunidade de escrever dois capítulos, nos quais destaco a necessidade da historicidade como horizonte de nossas formulações das questões ambientais e a importância da linguagem para a compreensão dos problemas e possibilidades envolvidos em elaborar um conceito contemporâneo de Natureza para a Educação Ambiental.
Retomando algumas concepções presentes na dialética grega e na filosofia hermenêutica de Gadamer, destaco que o conhecimento não resultava de uma atividade metodológica da consciência, mas era algo que a coisa fez e o pensamento sofre. O livro com esses comentários teve uma tiragem de 5.000 cópias (com distribuição gratuita nas escolas) e consta também no site do MEC/INPE.

Em meu estágio pós-doutoral, pretendo continuar e ampliar o diálogo da Educação Ambiental com suas bases filosóficas, epistemológicas, éticas e estéticas. Sobre isso Nascimento (2004 apud Griffth, 2009, p.6) nos diz: "que os filósofos brasileiros deveriam se dedicar mais à reflexão e publicar mais sobre a questão ambiental. Segundo ele, muitas das ações ambientais tomadas no Brasil ainda carecem de fundamentos filosóficos, muitas vezes são intelectualmente inconsistentes. A recomendação final desse pesquisador é que os filósofos brasileiros esclareçam melhor sua conceituação do status ontológico da natureza, ou seja, facilitaria o entendimento e a definição de "meio ambiente" no Brasil".
O presente projeto caminha nessa direção, principalmente considerando a valiosa contribuição que o professor colaborador pode dar. O Professor Eugene Hargrove (colaborador) do Departamento de Filosofia da University of North Texas é editor do Environmental Ethics, periódico dedicado à publicações interdisciplinares dos aspectos filosóficos dos problemas ambientais e Presidente do Center for Environmental Philosophy, que é referência internacional no campo da estética ambiental. E isso proporciona uma possibilidade única de contextualizar o Brasil no emergente debate mundial sobre Educação Ambiental, Ética Ambiental e Estética Ambiental.

INTRODUÇÃO
Minha trajetória em Educação Ambiental começou há mais ou menos quinze anos com a publicação de "Ética e Educação Ambiental: a conexão necessária", hoje na 14ª edição pela Editora Papirus, onde apontei para a impossibilidade de continuarmos presos a uma concepção mecanicista da Natureza. Sucederam-se diversos artigos e capítulos de livros abordando a temática do antropocentrismo e do racionalismo da modernidade Ocidental e suas consequências para a devastação ambiental.
Através da hermenêutica de Gadamer tenho procurado demonstrar como o diálogo com a história, com a arte e a filosofia pode nos levar a uma concepção melhor de qual é o nosso papel em relação à Natureza. Em livro recente (tese de doutorado defendida na University of Western Australia), propus uma ética de parceria com a Natureza onde explicito alguns pressupostos básicos de uma compreensão sustentável de nossas relações com o mundo não-humano.
Em Grün (2007b) propus uma concepção de Educação Ambiental na qual a Natureza fosse vista em sua outridade em relação ao mundo humano. Criticando a concepção antropocêntrica da ciência Cartesiana, observo que precisamos de "uma ciência em que a Natureza não é dominada, mas vista e experienciada como parceira num diálogo mutuamente benéfico" (Grün, 2007, p.166).
"Poderíamos talvez sobreviver como humanidade se fôssemos capazes de aprender que não podemos simplesmente explorar novos meios de poder e efetivas possibilidades, mas precisamos aprender e parar e respeitar o outro como um outro, seja ele (a) a natureza ou as culturas emergentes de pessoas e nações; e se fôssemos capazes de aprender a experienciar o outro e os outros, enquanto outro do nosso eu, para participar" (Gadamer apud Grün, 2007, p.167).
Em meu estágio pós-doutoral nos Estados Unidos, pretendo desenvolver um aspecto complementar de minhas produções anteriores e, ao mesmo tempo, também inovar através de uma nova proposição onde a Natureza já não se apresenta sempre enquanto reciprocidade entre o mundo humano e não humano, mas através de uma postura dominante.

ABORDAGEM TEÓRICA
A abordagem teórica a ser utilizada será a estética ambiental. A estética ambiental é um campo surgido a partir da estética moderna e foi criada como uma reação á redução da apreciação da beleza da Natureza á Filosofia da Arte. Nessa abordagem será necessário uma avaliação preliminar do histórico filosófico de nossa relação com a Natureza. Isso dá continuidade ao trabalho que vem sendo feito por mim e por outros pesquisadores no Brasil e um exemplo concreto disso é o livro do qual sou co-organizador e autor de dois capítulos que saiu recentemente pelo MEC, chamado "Pensar o ambiente: as bases filosóficas da educação ambiental". Procuro, então, reconstruir um pouco da trajetória do conceito de beleza e admiração pela Natureza para contrastar com a perspectiva do racionalismo cartesiano moderno.
Se revisarmos nossas trajetórias em Educação Ambiental muitos de nós encontrarão a beleza da Natureza como uma das principais fontes de inspiração para a proteção ambiental e também para o prazer. A Natureza é bela. Não há quem um dia não viu ou não sonhou com uma bela paisagem. Mesmo aqueles que moram nos grandes centros urbanos alimentam o sonho de encontrar o belo na Natureza seja através de fotografias, viagens ou simplesmente em unia inspirada imaginação. Mas na verdade, a Natureza passou a ser objeto de apreciação estética na filosofia somente recentemente.
É no séc. XVIII com as filosofias do sublime que a beleza da Natureza ganha respeitabilidade dentro da filosofia. A estética ambiental é ainda mais recente como campo de estudos, datando dos últimos trinta e cinco anos. Agora temos que nos perguntar por que algo tão importante quanto à consideração estética da Natureza em uma área tão profunda como é a filosofia tenha ganhado tão pouca atenção. Vamos refletir um pouco sobre isso. Os gregos acreditavam que o Cosmos, o Kalon, a ordem das coisas era bela e se sentiam integrados nesse mundo. Sentiam-se parte desse universo.
Os Medievais, a sua maneira, acreditavam em uma continuidade entre o mundo físico e o mundo não humano a tal ponto que na pintura de paisagens haviam sempre figuras humanas integradas. Na Renascença isso muda um pouco, pois já encontramos em Albertini alguns indícios do que iria acontecer com a frenética busca pela objetividade lançada por Descartes no séc. XVII. Refiro-me a Albertini porque em suas telas encontramos pela primeira vez a paisagem sem figuras humanas. Elas haviam saído da tela e se tornado observadoras externas buscando a objetividade.
Também na Renascença, Leonardo Da Vinci, ao inventar a técnica da perspectiva na pintura anunciava um novo mundo e conseguia geometrizar e matematizar suas obras. A arte anuncia com pelo menos cem anos de antecedência o que viria ocorrer na ciência moderna do séc. XVII. E é justamente nesse momento crucial para o desenvolvimento científico e tecnológico que começam as nossas dificuldades de apreciação estética da Natureza. É justamente na cisão entre sujeito e objeto e Natureza e Cultura anunciada na arte e concretizada na filosofia de Descartes que encontramos dificuldades de apreciação estética, pois essa distinção nos afastou da Natureza e tirou o nosso senso de pertença ao mundo. O processo de objetificação da Natureza apontado por Grün (2006, 2007) desestruturou as possibilidades de uma compreensão não instrumental do mundo não humano. No séc. XIX esse processo de objetificação da Natureza foi acelerado pelo desenvolvimento das ciências empírico-analíticas em conjunção com a Revolução Industrial.
No séc. XVII encontramos o momento chave que desencadeou esse processo de objetificação. Descartes busca discernir uma base sólida e estável para seus conhecimentos e é o criador do que Richard Rorty (1979) chamou de filosofia fundacional. Diz Descartes no séc. XVII

Comprazia-me, sobretudo, com as Matemáticas, por causa da certeza e da evidência de suas razões; mas não percebia ainda seu verdadeiro uso e, acreditando que serviam somente às artes mecânicas, surpreendia-me que, embora fossem firmes e sólidos seus fundamentos nada de mais elevado se houvesse edificado sobre eles. Do mesmo modo eu comparava os escritos dos antigos pagãos que tratam dos costumes nos palácios imponentes e magníficos, construídos, porém, sobre areia e lama. Erguem muito alto as virtudes e apresentam-nos como as mais apreciáveis de todas as coisas que existem no mundo, mas não ensinam a conhecê-las o bastante, e, com frequência o que denominam com um nome tão belo não revela mais do que uma insensibilidade, ou um orgulho, ou um desespero, ou um parricidio. (Descartes, 1998, p.35).

No Discurso do Método, em 1637, Descartes realiza uma mudança que vai da história, da cultura e da tradição ao "eu", a base de todo conhecer. E a partir desse movimento Descartes estabelece as fundações metafísicas da modernidade. Esse espírito de insatisfação força-o a estabelecer um novo método, no qual possam ser eliminadas tanto a perturbadora diversidade de visões quanto o potencial exagerado para o erro.
Descartes, com seu ataque persistente à cultura, à diversidade e à tradição aniquila a historicidade e com isso dificulta a compreensão das questões sociais, incluindo aí a questão da beleza da Natureza. Outro aspecto importante para compreender a dificuldade de apreciação da beleza da Natureza depois de Descartes reside na primazia do intelecto sobre os sentidos. O método da dúvida propicia o trajeto mais fácil para a mente ser levada para longe dos sentidos. Descartes duvidava de tudo: da existência do corpo, dos sentidos, da Terra, da necessidade de uni lugar para existir. Para Descartes o mundo físico é muito mais difícil de compreender do que a mente. Descartes quis eliminar a Cultura e sem cultura não há apreciação estética porque não há linguagem. Bordo (1987) denomina essa limpeza de "parto" através do qual se afirma a masculinidade do pensamento cartesiano em oposição aos mundos orgânico e feminino da Idade Média e do Renascimento.
Bordo (1987) assinala ainda que a objetividade e posterior objetificação do mundo transformou a Natureza em um objeto idílico de análise, dissecação e controle. As Meditações Cartesianas constituem, então, em um processo de purificação e aperfeiçoamento do intelecto e na Quarta Meditação, Descartes afirma categoricamente que é possível pensar sem o corpo. Já no séc. XVIII temos um período inovador em termos de considerabilidade estética da Natureza.
Os conceitos de "desinteresse" e "pitoresco" foram fundamentais para o desenvolvimento da apreciação estética da Natureza na filosofia. A arte deixa de ser o único crivo através do qual poderíamos apreciar ou compreender a beleza da Natureza. É através de Kant que encontramos uma virada nesse sentido. Na Crítica do Juízo, Kant argumentou que a beleza natural é superior a da arte. O aspecto revolucionário de sua teoria consistiu no desenvolvimento do conceito de "desinteresse" na apreciação da beleza natural, ou seja, a fruição estética descompromissada em vez do engajamento. "A classificação de Natureza em termos do conceito de desinteresse dissociou a apreciação estética dos interesses pessoais, religiosos, econômicos ou utilitários, que poderiam impedir a experiência estética” (Carlson, 2008).
Três conceitualizações fundamentais se dão a partir do conceito de desinteresse. 1) A primeira é a beleza em relação a belos e cultivados jardins e paisagens européias.
2) A segunda é o sublime, em relação a elementos naturais aparentemente ameaçadores, vastos e poderosos como, por exemplo, grandes montanhas.
3) Mas o conceito de maior relevância para o desenvolvimento da teoria estética foi o de pitoresco. Esse conceito realizou algumas conexões importantes entre a beleza da Natureza e a arte. Vale lembrar que a palavra pitoresco em inglês vem de picture-like, ou seja, como uma fotografia.

Ainda hoje essa tendência se faz presente em muitas atividades de turismo. Já no séc. XX, talvez já indicando os caminhos que a nossa civilização tomou, ocorreu um grande declínio do interesse da filosofia na apreciação estética da Natureza e esta ficou mais restrita as suas conexões com a arte. Esse foi basicamente um resultado da hegemonia e redução da Arte à Analítica Estética. O ponto básico da Analítica Estética é que a apreciação da Natureza seria totalmente parasitária da Arte. Somente nos últimos trinta anos é que a considerabilidade estética da Natureza foi retomada pela filosofia em grande medida devido à devastação ambiental e a emergência dos movimentos ambientalistas.
A obra Verdade e Método de Gadamer publicada em 1960, embora não considere a possibilidade de uma estética da Natureza abre novas possibilidades de compreensão da Natureza em termos não instrumentais. Podemos fazer analogias interessantes entre a compreensão de uma obra de Arte a as possibilidades de apreciação da beleza da Natureza. Ao apontar o jogo como o modo de ser da arte, Gadamer abre a possibilidade de um engajamento com a obra de Arte em clara oposição a noção de fruição estética desinteressada. Além disso, Gadamer nos mostra através do jogo como a dicotomia "entre sujeito e objeto não é a única nem a maneira mais fundamental de compreender a existência humana" (Carvalho et al., 2009, p. 101). "A preocupação quase obsessiva do Iluminismo com a autoconsciência acabou por nos afastar de experiências que nos permitam compreender melhor nossa existência. Johnson (2000) observa que "o projeto de uma autoconsciência separou o sujeito e o objeto e restringiu a verdade ao domínio exclusivamente cientifico" (Carvalho et al., 2009, p. 102).
Gadamer é um crítico severo dessa tradição, pois ela nos alienou de verdades extracientíficas como a história e a arte. Gadamer acredita que estamos envoltos em um tipo de alienação estética. Kant, por exemplo, não concedia a experiência da arte o estatuto de verdade. A arte proporcionaria um prazer desinteressado, mas não um novo conhecimento. Mas se a ciência pode reservar o conceito de Verdade para si porque a arte não pode, pergunta Gadamer?
Se nos deslocarmos para além do exclusivismo do método que atribuía o estatuto de verdade à ciência, encontramos na Dialética Grega um exemplo útil para a reflexão sobre a alteridade da Natureza, pois o conhecimento de uma coisa não resultava de uma atividade metódica da consciência, mas sim de algo que a coisa mesma fez e que o pensamento sofre. Sobre isso, Gadamer (1995) nos diz que:
"Nós podemos ver agora que esta atividade da coisa consigo mesma no vir à fala do significado, aponta para a estrutura universal, nomeadamente para a natureza básica de tudo através do qual a compreensão pode ser dirigida. Ser que pode ser compreendido é linguagem" (p.474).
Desse modo, podemos afirmar que existe urna linguagem da Natureza e é isso que a toma inteligível para nós. Gadamer (1995) lamenta o fato de as ciências modernas não terem percebido isso.
“as ciências modernas não vêem a natureza como um todo inteligível, mas como um processo que não tem nada a ver com os seres humanos, um processo no qual a pesquisa cientifica lança uma limitada, mas confiável luz, tomando então possível controlar a natureza. Assim, a mente humana, procurando certeza e proteção encontra o conhecimento científico contra a incompreensibilidade da vida, esta temível instância" (1995, p. 475).
A interpretação da Natureza pode ser melhor compreendida com referência a um certo número de analogias relativas á experiência da arte e da história. Os procedimentos objetificadores das ciências naturais procuram conhecer sem reconhecer a dimensão linguística do conhecimento de nossa experiência, dirigindo simplesmente para a certeza, e para uma crescente dominação do ser (Grün, 2005).
Uma das melhores analogias para se compreender a beleza da Natureza é o conceito de jogo. Através desse conceito podemos compreender que para que a apreciação estética da Natureza se efetue é necessário um engajamento que desestruture a distinção entre sujeito e objeto. Assim, a Natureza poderia se apresentar em seu verdadeiro modo de ser que é o de auto-apresentação e não da determinação objetivista ou da construtibilidade mecânica da mente. A compreensão da Natureza envolve respeito pela sua outridade. A Natureza nos interpela. A compreensão só é possível quando nós retemos o respeito pela alteridade daquilo que queremos compreender. E isso só ocorre quando nos engajamos em um diálogo, em uma genuína troca de experiências. Caminhando nessa direção, recentemente esbocei uma ética de parceria com a Natureza em Educação Ambiental, baseada na humildade e no diálogo com a Natureza (Grün, 2007).
A ética de parceria com a Natureza é possível em termos linguísticos e não dicotômicos porque como nos diz Gadamer "a fala não pertence à esfera do eu, mas á esfera do nós". Isso ocorre se considerarmos a Natureza como um Tu e nos dermos conta que a realidade da linguagem viva é o diálogo e quando o diálogo "termina", emergimos "saciados" e transformados. Esse é um processo que envolve transformação e, por isso, é importante para a Educação Ambiental. A diferença básica para a postura de Descartes e das ciências que o sucederam é que a linguagem era vista como uma produção do mundo da subjetividade. Hoje, corno sabemos, a linguagem transcende a consciência individual. Gadamer vê uma harmonia, não na natureza das coisas (essencialismo), mas na linguagem das coisas "que querem ser ouvidas da forma em que as coisas trazem-se para a expressão na linguagem".
Quando Ficamos mais cientes de que a nossa experiência de mundo é linguística, começamos a compreender a outridade da Natureza. O entrar na linguagem ocorre precisamente no momento em que o elemento da aplicação apresenta-se, como sugere Gadamer (1998) em sua leitura de Aristóteles. Precisamos estar em relação com a Natureza e "estar em relação a algo" é, para Gadamer (1995), um fenômeno moral. Nós participamos da Natureza e a Natureza participa de nós. É uma relação Eu-Tu. Já a relação eu-isso não pode ser defendida como relação. Assim, podemos dizer que pensadores como Francis Bacon, Galileu e Descartes, tiveram uma relação eu-isso com a Natureza, pois esta foi tratada como mero objeto à disposição da razão.
Para descrever a nossa relação com a Natureza, Martin Buber usou termos como majestosa, fascinante, e amedrontadora, mas salientou também que nenhum adjetivo é capaz de descrever inteiramente essa relação. Ele criticou a nossa separação da Natureza e disse acertadamente, que estamos entrelaçados no tecido da Natureza, ela é uma parte de nós e nós somos uma parte dela. Tanto Gadamer (1995) como Buber (1996) entendem que a relação entre seres humanos e Natureza deveria ser mutuamente benéfica.
Já o filósofo ambiental e alpinista Peter Reed (1989), embora reserve também um espaço para alteridade da Natureza, vê esta sempre como dominante, Isso tem consequências tanto éticas quanto estéticas. Em termos de estética podemos destacar a possibilidade de auto-representação da Natureza, seu poder de sedução e convite ao engajamento, rompendo, assim, com a frieza epistemológica cartesiana e despertando a sensibilidade perdida pelo mundo mecânico. Mas quero ressaltar também que a ética de parceria proposta por Reed (1989) que vê a Natureza quase sempre como parceira dominante também tem implicações estéticas.
Atualmente, perdemos um precioso senso de nossa insignificância diante da vastidão infinita do Cosmos. Muitas vezes a Natureza nos convoca a lembrarmo-nos disso. Para Peter Reed, os desastres "naturais" corno são chamados, têm o potencial de servir de uma espécie de aprendizagem a partir da qual podemos mudar nossas atitudes, por mais vagaroso que possa parecer esse processo. Eu descrevo essa possível estética como uma espécie de respeito combinado com medo e desejo. E as considerações de Gadamer sobre a capacidade da obra de arte de comunicar a si mesma podem ser bastante úteis para compreender a minha proposição estética da Natureza como parceira dominante.
Gadamer (2000) diz que "Quer nós chamemos o trabalho de arte uma criação inconsciente do gênio, ou consideremos a inexaustabilidade de cada criação artística do ponto de vista do observador, a consciência estética pode apelar para o fato de o trabalho de arte comunicar a si mesmo" (p.181). Poderíamos nos perguntar agora se a Natureza comunica a si mesma. Minha resposta é sim, só que nós não nos aprimoramos ainda na hermenêutica da escuta e ainda não abrimos os devidos canais de comunicação com o mundo não-humano.
Para Gadamer (2000) a questão fundamental de uma obra de Arte é se ela tem algo a nos dizer.
"A intimidade com que o trabalho de arte nos toca é ao mesmo tempo, uma moda enigmática, um devaneio e uma demolição do familiar. Não é apenas a tua arte revelada em um alegre e assustador choque, mas também diz para nós: Tu precisas alterar a tua vida" (Gadamer, 2000, p.186).
E isso é fundamental para a Educação Ambiental. Por isso podemos dizer que a Natureza é o outro que nos convoca em todo seu poder de sedução e beleza, mas que tudo isso hoje é mesclado com um profundo sentimento de respeito, medo e desejo. O medo e o desejo não são mais elementos separados de nossa admiração pela Natureza.
A nossa relação ideal com a Natureza é de reciprocidade como assinalam Gadamer, Buber e Grün (2007), mas a Natureza tem se apresentado também como dominante. Com a força, o vigor e o impulso extraordinário que ela tem. Já longe do rigor analítico que a derrubou. Esse poder e força podem ter um papel educativo-ético-estético importante, pois nos descentra do desconcertante antropocentrismo em que nos encontramos e nos faz cientes diante de nossa insignificância. Não se trata da insignificância das pessoas. As pessoas são importantes. É sim, a nossa insignificância diante da Natureza, da Terra em sua jornada de formação desde os tempos imemoráveis antes da presença da vida no planeta.
É nesse sentido que precisamos respeitar profundamente o que existe, pois isso não foi feito por nós e precisamos nos lembrar disso, ainda que isso nos leve muitas vezes a sentir medo. Mas não quero dizer com isso que as catástrofes naturais são bonitas. Nem mesmo que os terremotos são belos como apregoava John Muir. Mas que o reconhecimento de nossa insignificância perante o Cosmos e a força da Natureza é talvez o mais belo caminho que uma estética da Educação Ambiental possa tornar para que sejamos reconduzidos a uma hermenêutica da escuta da Natureza na qual possamos alcançar um mundo melhor onde o Kalon, a ordem das coisas belas, como chamavam os gregos, seja mais respeitada.

METODOLOGIA
A metodologia a ser utilizada é a hermenêutica. A hermenêutica é quase tão antiga quanto a filosofia e tem como marco referencial no séc. XX o trabalho de Gadamer. Mas para compreendermos porque essa metodologia é a mais apropriada para o bom andamento da pesquisa é necessário que nos remetamos aos antecedentes históricos da hermenêutica filosófica. É através da exploração do que significa a circularidade da compreensão que podemos fazer isso. Vejamos isso mais de perto. Para Gadamer (1988) o movimento da compreensão sempre vai do todo para as partes e das partes para o todo. A ausência desse círculo determina uma falha da compreensão. A regra hermenêutica segundo a qual a compreensão se move do todo para as partes e das partes para o todo, na verdade, já se faz presente na retórica grega antiga. Mas para compreendermos essa ideia em termos do que ela representa enquanto abordagem metodológica podemos começar nossa discussão com Schleiermacher no séc. XIX.
Schleiermacher (1768-1834) acreditava que a hermenêutica fosse urna arte de mover-se dentro do pensamento de outra pessoa e compreender aquele pensamento a partir da perspectiva de outra pessoa (Johnson, 2000). Tratava-se de compreender a intenção do autor. Schleiermacher já percebia a impossibilidade de um ponto arquimédico da consciência para nos interpretarmos c isso já representava urna derrocada das pretensões últimas de fundamentação metafísica. O que é para ser compreendido a partir de Schleiermacher já ao são as palavras exatas ou objetos, mas a individualidade (interioridade) do autor. E essa individualidade é uma pequena parte de uma manifestação da vida universal. Assim, todos nós carregaríamos urna parte de cada um de nós em si mesmo.
O método é comparativo e divinatório. Ou seja, ele compara o que é comum entre os interlocutores e faz uso do método divinatório (teológico) com o qual tenta subsumir a individualidade do conjunto da humanidade. "Compreender é uma operação essencialmente referencial; compreendemos algo quando o comparamos com algo que já conhecemos" (Palmer, s.d., p.93). Seu método foi extremamente ousado para sua época, mas logo foi superado por apresentar uma concepção de ciências humanas por demais presa à teologia. Schleiermacher costumava dizer que seu objetivo com a hermenêutica era compreender o autor melhor do que ele compreendeu a si mesmo com isso, Schleiermacher entende a compreensão como um movimento circular.
Dilthey (1833-1911) aperfeiçoa e retoma de Sehleiermacher a noção de circularidade da compreensão. Ele também nutria um grande otimismo em relação ao progresso da cultura científica. A escola histórica de Dilthey reclamava para si o conceito de ciência e, sobretudo, reivindicava desse conceito os conceitos de método e objetividade, pertencentes à ciência moderna. Ele queria pensar esses conceitos de objetividade e método para a vida histórica. Gadamer situa Dilthey não como um positivista, mas como um filósofo que ocupa um lugar entre a teoria do conhecimento e o legado da filosofia romântico-idealista que buscava a aproximação entre vida e história (Gadamer, 1995). Essas eram exigências metodológicas do historicismo. Tratava-se de legitimar as ciências do espírito (históricas). Dilthey queria proteger a compreensão histórica da arbitrariedade do subjetivismo. Ele parece tentar conjugar a ciência com a vida histórica, acreditando que a hermenêutica nos dá a possibilidade de estabelecer uma ciência da compreensão que pode fornecer uma fundamentação metodológica para as ciências humanas, discernindo explicação de compreensão. A explicação seria o procedimento análogo ao das ciências naturais, ao passo que a compreensão contemplaria o indivíduo em sua interioridade. Dilthey, tal como Schleiermacher, entende a compreensão como um movimento circular. Mas Dilthey ainda mantém a estrutura circular da compreensão confinada dentro de uma relação formal entre o todo e as partes.
É somente com o jovem Heidegger (1915-1923) que o circulo da compreensão deixa de ser um círculo formal e vicioso. Seguindo Heidegger, Gadamer (1983) buscará se desviar do conceito de “circulo vicioso”. Ele mostrará que o círculo hermenêutico não é um círculo formal, mas um círculo que descreve a compreensão como um jogo interno entre a tradição e o intérprete" (Grün, 2007, p.100-101)-Seguindo em sua reflexão, Grün (2007) afirma que "compreender não mais significa
compreender uma causa, pois, "após Heidegger (1999) emerge uma valorização ontológica do conhecimento histórico na estrutura da compreensão histórica da existência humana" (p.101).
Para Gadamer (1998), (...) essa nova estrutura projetiva do estar ai endossa o conhecimento histórico com um novo status e permite que os preconceitos agora tenham um papel relevante referente à noção de ciência. Esses desenvolvimentos da hermenêutica proporcionaram uma nova compreensão da ciência, na qual esta estaria sempre sujeita a novas redefinições. "Se não me equivoco, a solidariedade da ciência se baseia em primeiro lugar na correspondente limitação do conhecido e na renovabilidade de todo conhecimento científico" (Gadamer, 1990, p.97). Heidegger (1999) nos mostra que o circulo da compreensão tem uma significância ontológica positiva. E o resultado disso é que a interpretação não pode ser arbitrária, pois qualquer compreensão será sempre uma projeção que poderá ser corrigida pelo contato com o outro. Nós sempre temos expectativas na leitura de um texto e projetamos significado em um todo. "Por outro lado é apenas porque alguém de inicio lê o texto com certas expectativas de um significado definido que o significado inicial se torna aparente" (Gadamer, 1988, p.71). É através dessas constantes projeções que vamos fazendo as nossas revisões de significado na ciência. Para que estas constantes revisões ocorram é necessária uma abertura ao que o outro, a Natureza, quer dizer e a eliminação de todo pressuposto de neutralidade.
A questão da cientificidade na hermenêutica filosófica ganha urna outra dimensão ao nos darmos conta que a consciência histórica não aceita autoridades inquestionáveis no que se refere ao status calo do fazer científico. A tarefa da hermenêutica filosófica é não só explicitar os preconceitos e pré-concepções que originam o fazer cientifico. Mas sua tarefa última, através da consciência histórica, é saber discernir os falsos preconceitos daqueles verdadeiros. É justamente nessa humildade filosófica — saber reconhecer que o outro, a Natureza, pode estar correto e nos modificarmos a partir disso — é que consiste a metodologia adequada para a transformação do eu antropocêntrico cartesiano que ainda nos leva a uma postura objetificadora e nos impede de apreciar a beleza da Natureza



Atividade da Natureza

on quinta-feira, 20 de novembro de 2014
Em contraste com as visões modernas de natureza, busco em meu trabalho formular um modelo interpretativo gadameriano em que aflore uma estrutura especulativa linguística, assim permitindo que a Natureza venha-à-fala. Para Gadamer (1995), tal processo lembra a dialética grega. Nela, o conhecimento de alguma coisa não era resultado de uma atividade metódica da consciência, mas, em vez disso, algo que a própria coisa fez e que o pensamento sofre. Apesar da tentativa de Platão de sair do reino da linguagem em sua formulação da Teoria das Formas, no pensamento grego a coisa mantinha certa dignidade da coisa": "Podemos ver que tal atividade da coisa, o vir-à-falado significado, aponta para uma estrutura universal, a saber, a natureza básica de tudo para o qual é dirigida a compreensão. Ser que pode ser compreendido é linguagem" (p. 474). A hermenêutica projeta assim suas capacidades de volta para a realização ontológica do que é interpretado. Pode então ser possível falar em uma linguagem da Natureza, uma linguagem da Arte etc. A Natureza torna-se desse modo inteligível. Mais importante: essa visão contrasta agudamente com os resultados da ciência moderna. Como observa Gadamer.

(...) assim como a ciência moderna não vê a natureza como um todo inteligível, mas como um processo que não tem nada a ver com os seres humanos, um processo em que a pesquisa científica lança uma luz limitada mas confiável, viabilizando o controle, assim a mente humana, buscando proteção e certeza, coloca a compreensão científica contra a "incompreensibilidade da vida", este semblante amedrontador (Idem, p. 239)

Na hermenêutica é perfeitamente legítimo falar em um "livro sobre a Natureza", uma vez que tudo o que pode ser compreendido é de fato linguagem (Gadamer 1995). Isso não é dizer que um segundo ser emerge quando a Natureza vem-à-fala, mas sim propor que o que se apresenta como coisa pertence a seu próprio ser. "Seu próprio ser físico existe unicamente para desaparecer no que é dito. Da mesma forma, o que entra na linguagem não é algo anterior à linguagem; em vez disso a palavra fornece sua própria determinação" (idem, p. 475).

Boa parte disso pode ser dita quanto à interpretação da obra de arte. O ser de uma obra de arte não é um "ser em si mesmo" que difere de sua reprodução ou da contingência de sua aparência. O significado de um evento, texto ou mesmo da Natureza não é um objeto que exista por si só, pois há sempre um mediador, um intérprete entre o passado e o presente. A função da hermenêutica consiste, portanto, na tematização dessa tensão. Nossa relação com o mundo é, por sua própria natureza, verbal do ponto de vista hermenêutico da linguagem. O "ser em si mesmo" é meramente abstração. A interpretação da Natureza pode realmente ser mais bem compreendida com referência a algumas analogias relativas à experiência interpretativa da arte e à experiência interpretativa arte e à experiência interpretativa da história. Os procedimentos objetificadores das ciências naturais, buscando conhecer sem reconhecer a dimensão linguística de nossa experiência de conhecimento, buscam simplesmente a certeza e uma crescente dominação do ser. E nenhuma outra forma do conhecer é válida. Entretanto, como já foi observado, Gadamer argumentou que a compreensão da obra de arte requer uma postura diferente, em que à coisa é conferida certa dignidade - "a coisa mantém sua dignidade". Na Parte I de Verdade e método, Gadamer (1995) mostra que uma compreensão genuína da obra de arte ocorre através da liberação da arte e da história do objetivismo. Os conceitos de arte e história são formas de compreender "que emergem do modo universal dos seres hermenêuticos como formas de experiência hermenêutica" (p. 476). Essa experiência hermenêutica de uma compreensão da arte ocorre previamente à atividade refletiva.

Como observa Flickinger (Apud Almeida, Flickinger e Rohden 2001), "trata-se aqui, sempre, de algo ou de alguém que se encontra à nossa frente e, como tal, dirige-se a nós e inquieta-nos, devido única e exclusivamente ao fato de ser outro que nós mesmos" (p. 28). Proponho que deveríamos buscar interpretar, compreender a Natureza da mesma forma que compreendemos uma obra de arte. "A obra de arte é um convite insistente a que nos deixemos sugar para dentro do espaço de um mundo novo alheio" (idem, p. 33). Nesse espaço ocorre o desfazer dos hábitos que anteriormente determinaram nossa postura antiecológica diante da Natureza.

O conceito de jogo é particularmente importante para melhor compreendermos a experiência hermenêutica, pois seu modo de ser é o da auto-apresentação. O ser estético também depende da própria noção de apresentação. A Natureza, por sua vez, não será ouvida a não ser que nos comprometamos com ela, a não ser que tenhamos a vontade de ouvi-la. Isso não quer dizer que a Natureza careça de autonomia, mas que a Natureza, assim como o ser estético, adquire seu ser exatamente no ato da auto-apresentação.
Tornada como chave decifratória à experiência hermenêutica, a ontologia da obra de arte anuncia os elementos fundadores do compreender. São eles a solicitação do estranho, uma disposição de entrega ao aberto e à linguagem, esse horizonte intransponível de nosso encontro com o mundo. (Apud Almeida, Flickinger e Rohden 2000, p. 44).

A questão é, pois, que, a não ser que o intérprete seja interpelado pela coisa, sendo esta unia obra de arte ou a Natureza, ele jamais teria a permissão para buscar compreendê-la. É importante enfatizar, então, que o que buscamos compreender não se mantém estático. Essa compreensão será possível somente se envolver respeito pela dignidade, pela alteridade daquilo que queremos compreender. Aquilo com o qual estamos familiarizados não nos estimula a investigar. E é por meio da investigação que o sujeito emerge além de seus próprios limites. A compreensão só será possível se envolver respeito pela alteridade do Outro que buscamos conhecer. O processo de questionamento necessitará de respeito pelo Outro em sua diversidade. Esse processo só pode ocorrer quando nos comprometemos com o diálogo com a Natureza como urna verdadeira troca de experiências.
Gadamer (1995) explica esse respeito pela outridade com referência ao jogo. O jogo para ele é um modelo estrutural de diálogo. No jogo os parceiros se testam. Na verdade. Gadamer sugere que, para os que estão verdadeiramente envolvidos no jogo, a experiência é de "auto-esquecimento". Eles perdem o rastro de seu próprio ser, por estarem concentrados no jogo. Para Gadamer, isso serve corno perfeita analogia do ato da compreensão.

Os gregos definiam como Kalon (coisas belas) aquelas cujo valor era evidente e cujo propósito era inquestionável. "Elas eram desejáveis por si sós (di'haouto haireton) e não, como as coisas úteis, por algum outro motivo" (Gadamer 1995, p. 477). Essas coisas tinham um valor intrínseco. Em contraste, os modernos argumentam que a mente humana artística define as coisas como úteis ou belas. Esse modo de compreensão mantém certa analogia com a explicação da Natureza para a ciência moderna. A atitude fundamental da ciência é a dominação do ser.

A beleza da Natureza perdeu sua prioridade a ponto de ser concebida como reflexão da mente. (..) A ciência admite a beleza da natureza, da arte e o prazer abnegado que estas conferem - mas apenas em suas próprias fronteiras, as fronteiras da dominação da natureza. Ao descrevermos o inverso da relação entre a beleza da natureza e da arte, discutimos a mudança através da qual a beleza da natureza perdeu sua prioridade a ponto de ser concebida como reflexão da mente. (Gadamer 1995, p. 480)
Gadamer argumenta que a Natureza (o não-eu) perde a dignidade que os gregos lhe atribuíram no mundo das coisas belas, o Cosmo, e torna-se um espelho do conceito de arte. É necessário compreender algumas implicações do conceito grego de beleza para a hermenêutica. Platão explicou em Filebo que a beleza não é simples simetria, salientando que sempre está relacionada à noção de "reluzir". A beleza tem o modo de ser da luz. Gadamer propôs que o reluzir de algo surge quando aparece aquilo em que a luz reflete. A beleza, portanto, tem o modo de ser da luz, do reluzir. E a luz que faz isso acontecer é a luz da palavra. A metafísica da luz serve, então, para mostrar precisamente que tipo de relação guia a pesquisa hermenêutica. Ainda assim, isso serviria para restaurar o platonismo? A resposta é não, pois é perfeitamente possível separar a estrutura da luz de uma metafísica neoplatônica e, de fato, da metafísica crista de onde se origina. Já na interpretação do Gênesis de Agostinho, encontramos os elementos da compreensão de uma interpretação especulativa da linguagem em que a multiplicidade do que ocorre no pensamento deriva unicamente da palavra, Além disso, Gadamer acredita que a filosofia grega pode ser particularmente produtiva para a hermenêutica, pois propõe que o "ser é auto-apresentação e que toda compreensão é um evento" (1995, p. 484). Duas outras questões podem ser colocadas para uma compreensão da metafísica da beleza: o esplendor do belo e a clareza do inteligível.
Tais considerações do modo de ser do esplendor do belo levam-nos ao entendimento de que o modo de ser do esplendor do belo tem o caráter de um evento. Até esta altura torna-se possível mais uma vez justificar a primazia da atividade da coisa (Natureza) na experiência hermenêutica. Mais importante, essa postura contrasta radicalmente com uma consciência metodológica moderna que busca controlar a coisa.

Na experiência hermenêutica, "a coisa mesma compele-nos a falar sobre o evento de uma atividade da coisa" (Gadamer 1995, p. 485). A conexão entre a compreensão e o belo, desse modo, bem fácil de apreender. O processo pode ser explicado dizendo-se que o ato de compreender é semelhante ao de acender a luz, processo em que tudo que está sendo analisado é de súbito aumentado. A forma de o logos grego expressar a Fundamentação da experiência é inevitavelmente fragmentada. Todavia, foi precisamente de uma tradição platônica que “foi desenvolvido o vocabulário conceitual exigido para o pensamento sobre a finitude da vida humana” (idem, pp. 486-487). A ideia platônica de beleza e a universalidade da hermenêutica estão intimamente ligadas. O modo de ser do belo é característica do ser em geral. Para Gadamer (idem, p. 487), "se partirmos da visão ontológica básica de que ser é linguagem i.e,, auto-apresentação - como nos revela a experiência hermenêutica do ser, então segue que o caráter do evento do belo é a estrutura-evento de toda a compreensão". Gadamer apresenta, desse modo, um Platão livre do elo com a Doutrina metafísica da Forma, um Platão para quem o elemento essencial do belo, aletheia, significava que o belo se revelasse em seu ser, que ele apresentasse a si mesmo.

A auto-apresentação é o verdadeiro ser da obra de arte, bem como da Natureza. É importante reafirmar que se trata de auto-apresentação da Natureza e não de representação, um conceito moderno e objetificante. O conceito de jogo é essencial ao ato de compreensão. A compreensão é, desse modo, não uma atividade técnica, mas uma experiência genuína em que nos comprometemos com algo, como a Natureza, que, por sua vez, se apresenta como verdade. Esse compromisso ocorre na interpretação verbal, e as palavras que trazem algo para a linguagem são elas mesmas um evento especulativo. Além disso, essa característica da compreensão reafirma a "dignidade da coisa". O significado da coisa é verdadeiramente auto-expresso - não pertence ao falante nem ao que é falado. "Tudo que entra na linguagem, e não apenas o poético, tem sobre si algo desta qualidade da auto-atestação" (Gadamer 1995, p. 489).

Trecho do meu livro "Em Busca da Dimensão Ética da Educação Ambiental"
Mauro Grün - Doutor em Ética e Educação Ambiental pela University of Western Australia

Script da vida de Mauro Grün

on quarta-feira, 12 de novembro de 2014
Mauro Grün fez o ensino fundamental e médio em escola pública, Colégio Estadual Presidente Castelo Branco (Castelinho). Lembra de muitas amizades como Luis F. Johan (lingüiça), Paulo Aires e Gavuto (Gabriel Aires) e Tano (Luis Cristiano). Morou em Lajeado até 1984. Na adolescência viveu momentos de grande rebeldia contra o status quo da sociedade Lajeadense e montou uma banda de Rock com Ricardo Arenhaldt (bateria), Vico Marmitt (baixo), Assis Barros (poeta) e guitarra solo; no repertório muito Beatles, Stones e composições próprias. “Éramos ingênuos e rebeldes, pensávamos que poderíamos mudar o mundo através da música”. Participamos do l Musivale (junto com Luis Carlos Barros).

Hoje Mauro declara ter se reconciliado com Lajeado. “A cidade tem uma ótima qualidade de vida”.  Tem o teatro do SESC e o espaço cultural Dr. Dewes. Cita como opções os músicos e amigos Solon Chaves, Alex Lima, Max Lima e a bela voz de Cristiana Pretto, além, é claro, de seu mano Marquinhos Grün, baterista da Orquestra de Teutônia e professor de bateria no CEAT (como atividade curricular).

Assis Barros Filho e Mauro Grün

Com a morte prematura de Assis Barros, companheiro inseparável de poesias, músicas e amizade, Mauro decide se mudar para Porto Alegre para cursar filosofia na UFRGS. No seu primeiro dia em Porto Alegre ganha o livro “Morangos Mofados”  (Caio Fernando Abreu) e a “Metamorfose” (Kafka) de sua namorada Graça Silveira. Devorei. Voltei a Lajeado dizendo “Paris não é uma festa” (conto de Caio).
No curso de filosofia fez muitas amizades; Julio Bernardes, Reginaldo, Antonio Augusto Goulart, Artur (Kantiano de carteirinha), João Cleo (grande poeta) e Renato Sartori, com quem lê Miler. Ficamos impressionados com a força de sua interpretação do gênio de Dostoiévski. Já na aula inaugural no curso de filosofia, proferida pelo professor Cirne Lima, ficou tudo muito claro. “Bem vindos a Europa”, disse ele, “pois esse é o nosso nível de exigência”. Na filosofia se impressiona com a maestria e brilhantismo do professor Balthazar Barbosa Filho com quem estuda Descartes, História da Filosofia, Filosofia Moderna e Filosofia Analítica.

Professor Balthazar Barbosa Filho

Durante quatro anos morei numa República, uma velha casa na Luis Afonso, cidade baixa, com mais trinta e dois estudantes. Todos marxistas stalinistas, menos eu e o sociólogo Yuri Azeredo. Nós cultivávamos algumas formas de anarquismo (Kropotkin). Muitas vezes as assembleias em Casa iam até às cinco da manhã. Eu e o Yuri Azeredo não aceitávamos o estatuto da Casa do Estudante e apregoávamos a vida comunitária sem uma rígida divisão de tarefas. Ou seja, cada um poderia fazer o que quiser. Na José do Patrocínio morava outro anarquista, diretor de teatro e amigo, Paulo Flores, do grupo Oi Nóis aqui Traveis, no final eu e o Yuri acabamos derrubando o estatuto, a vida melhorou e todo mundo começou a se dar bem.

Quando me formei em filosofia me aproximei muito do amigo Luis Gomes, hoje editor da Sulina. Eu e o Luis Gomes passamos por muitas dificuldades financeiras. Nos encontrávamos quase todos dias para criticar à Escola de Oxford. Tenho saudades daquele tempo. Um dia o Luis me aparaceu com livro a Miséria do Cotidiano do Juremir Machado e perguntou “Mauro, ainda existem out-siders? Devorei o livro do Juremir, às páginas pareciam ter grudado em meu peito.

Desde que retornou dos Estados Unidos, Mauro voltou a morar com seus pais, Ilson (pigico) e Marlene. Seus melhores amigos são Sergio Korbes (zebrinha), Lele Bosse e o artista plástico Paulo R. Zart (Passarinho). Hoje Mauro Grün trabalha a ideia de um livro que trata da convivência simultânea de sentimentos como solidão, disciplina filosófica, loucura e razão. É de cunho biográfico, mas contará com citações diretas de Descartes e Samuel Beckett (essa parte do manuscrito será submetida a apreciação dos filósofos Hans-Georg Flickinger e Ernildo Stein. 

Trata de acontecimentos verídicos ocorridos em 1996. Morando sozinho na Oceania (seu flatmate havia viajado para India), Mauro procura o Psiquiatra Rod Brown e afirma estar sofrendo de um fenômeno chamado repressed memory. Os anos oitenta e setenta passam como um filme em sua mente. Envolto em pensamentos delirantes, o filósofo embarca para Los Angeles a procura de seu passado, é encontrado vagando sem destino no Aeroporto, há três meses sem fazer a barba. Um comandante da Varig o reconduz ao guichê de passagens e emite um ticket a Porto Alegre, onde é encontrado por Marquinhos Grün.

De volta a Lajeado encontra aquele que seria o maior amor de sua vida, Fabiana Donadel e se converte ao Cristianismo, de volta a Australia, Mauro é internado no Perth Royal Hospital, onde sofre um surto psicótico. Nessa época fica aos cuidados de médico budista do Sri Lanka e o filósofo Andrew Brennan e Norva tornam-se seus melhores amigos. O livro retrata a profunda dor de um ser humano que perde a coisa mais importante na vida de um filósofo; a razão.

Hoje Mauro se encontra aos cuidados do Dr. Leandro Luz e faz terapia com a Dr. Luisa Isabel D. Gimeno. Divide o seu tempo entre Lajeado, Porto Alegre e a praia dos Ingleses, onde mora sua filha Isabel, a maior alegria de sua vida.


É autor, entre muitos outros artigos, de “Gadamer and the Otherness of Nature: Elements for an Environmental Education”. Human Studies (2005) 28:157-171

Raízes Filosóficas da Crise Ecológica

Gadamer (1995) afirma que a filosofia grega inicia precisamente com a compreensão de que a palavra é simplesmente um nome e como tal não representa um ser real. Gadamer argumenta que, em Crátilo, Platão buscava estabelecer a relação entre a palavra e a coisa. Sócrates, por sua vez, vê o logos como o aparecimento e a manifestação da coisa. Consequentemente, a fala constitui o verdadeiro locus em que a linguagem tem a capacidade de realizar seu pleno potencial. A verdade de alguma coisa reside na fala. Crátilo questiona a relação entre a palavra e o objeto. Contrário à sugestão contida em Crátilo, Sócrates coloca que é impossível saber completamente o significado de um nome contido na linguagem. Crátilo confirma a desvalorização da linguagem que Platão opera através da defesa da Teoria das Formas. Nela, Platão propõe duas teses: "a convencionalista, defendida por Hermógenes, que sustenta a justeza e a correção dos nomes dos objetos como meramente uma convenção e acordo" (384d), e "a naturalista, argumentando que há uma correlação entre os nomes atribuídos às coisas e as coisas em si (383a)" (Paviani 1993, p. 17). Em última análise, essa aporia leva a uma admissão dos aspectos de ambas as hipóteses. Na leitura que faz de Platão, Gadamer (1995) propõe que a questão presente em Crátilo relaciona-se a ser a palavra simplesmente um signo ou ter uma relação significativa com a imagem. A conclusão proposta em Crátilo é de que "o logos representa a esfera da noética na variedade de suas associações, então a Palavra, assim corno o numero, torna-se o mero signo de um ser que é bem definido e daí pré-conhecido" (p. 412).

O signo é desse modo, aquilo que se apresenta em sua própria ausência. Consequentemente, a palavra não é um signo puro nem uma cópia de um objeto.
A linguagem matemática dos signos não pode ser concebida sem a linguagem viva do diálogo para introduzir um conjunto de convenções. Desse modo, Gadamer argumenta que a matemática não é, de modo algum, uma linguagem. O desenvolvimento de uma terminologia científica é uma fase desse processo de introdução de um conjunto de convenções. "Um termo técnico é sempre algo artificial na medida em que a Palavra é formada de modo artificial - como é mais frequentemente; uma palavra já em uso tem a variedade e o alento de seus significados extirpados e lhe é atribuído apenas determinado significado conceitual" (idem, p. 415). O significado vivo das palavras contrasta radicalmente com o significado dos termos técnicos e da linguagem científica (...)

O sonho da modernidade tem sido o de ser o simbolismo da matemática capaz de superar a contingência da linguagem histórica. A linguagem, no entanto, é mais do que um mero sistema de signos que denote a totalidade dos objetos. A linguagem técnica, em contraste, é completamente separada do ser dos objetos aos quais se refere. A esta altura torna-se mero instrumento de subjetividade. Esses níveis abstratos de formulação levam, portanto, à criação de uma linguagem artificial. Gadamer argumenta que esses níveis de abstração na verdade contradizem a própria natureza da linguagem: "A linguagem e o pensamento sobre as coisas estão tão ligados que é uma abstração conceber o sistema de verdades como um sistema anterior de possibilidades do ser para o qual o sujeito significante selecionasse signos correspondentes" (1995, p. 417).

Na realidade, no entanto, buscamos a palavra certa ou a palavra mais capaz de conter a análise de determinado objeto, para garantir que tome a forma na linguagem. O logos está ligado à linguagem. O falado existe apenas na íntima relação entre a palavra e o objeto. Importante: a filosofia grega buscava estabelecer a visão de que a linguagem não possui um ser. Poderíamos argumentar, portanto, que a pretensão de uma correlação de nomes proposta no Crátilo foi, de fato, o primeiro passo no sentido da criação de uma moderna teoria instrumental da linguagem. Gadamer, no entanto, acredita que a história do pensamento ocidental contenha a possibilidade de garantia de que o ser da linguagem não deveria ser completamente esquecido. Ele refere-se aqui à noção cristã de encarnação. Pois a encarnação está intrinsecamente ligada à questão da palavra. O que realmente importa é, então, a relação entre a fala e os pensamentos humanos. Se a palavra torna-se carne, a linguagem tem uma significância e uma dimensão estranhas à filosofia grega. "A unicidade da redenção introduz a essência da história no pensamento ocidental, traz o fenômeno da linguagem de sua emersão na idealidade do significado e apresenta-o à reflexão filosófica. Pois, em contraste com o logos grego, a palavra é puro evento (verbum proprie dicitus personalites tantum)" (Gadamer 1995, p. 429).(...)

Em seu Comentary on John, Whitelaw (1993. p. 4) observa que, com o advento do cristianismo, João não usa mais o logos no "sentido da ratio, razão, pensamento da filosofia grega, mas de oratio, fala, discurso". Todos esses componentes são fundamentais para uma compreensão da noção que Gadamer (1995) desenvolve na Parte III de Verdade e método.  A noção de linguagem enquanto evento. Consequentemente, Gadamer estende tal noção dinâmica de linguagem e compreensão em sua interpretação de Agostinho e Tomás de Aquino. O encontro entre a teologia cristã e a filosofia grega representa, desse modo, a história subsequente do conceito de linguagem no Ocidente. João dá o primeiro passo para a construção de um conceito não-instrumental de linguagem. Emerge uma nova orientação entre Pai e Filho, entre o Espírito Santo e a palavra. Agostinho e a escolástica buscavam explicar o mistério da Trindade. Preocupavam-se especialmente com a palavra secreta e com a relação entre esta e a inteligência. Gadamer (1995) salienta que o que é significativo nesse processo é que a palavra em si não é nada próprio, nem busca ser nada em si mesma; em vez disso, a palavra só pode existir em sua revelação. Isso é singularmente relevante para as concepções contemporâneas de Natureza, pois, para Heidegger, a Natureza só existe em sua revelação. Não estou dizendo que é necessário ser cristão para compreender a Natureza, mas sim que o encontro entre a filosofia grega e a teologia cristã oferece poderosos insights para uma compreensão não-instrumental da Natureza. (...)

Para a escolástica, Agostinho e Tomás de Aquino a palavra temo caráter ontológico de um evento; a palavra retém sua relação intrínseca com o possível enunciado. Supondo-se que um processo do pensar até o final envolva a enunciação, encontra-se um elemento processual na palavra secreta. Na verdade, Platão já descrevera o pensamento como um diálogo da alma consigo mesma. Contudo, no pensamento do neoplatonismo medieval, a ideia de emanação implica mais do que um simples movimento físico de fluência. É no próprio processo de fluência que as coisas emanam. O "Uno de Plotino" não é concebido como privado nem esgotado, e o mesmo pode ser aplicado ao nascimento do Filho do Pai. Na emergência mental que ocorre no processo do pensamento há algo semelhante. Desse modo, Gadamer (1995, p. 424) segue dizendo que "o processo e emergência do pensamento não é um processo de mudança (motos), não é uma transição da potencialidade à ação, mas uma emergência, ela actus ex actus".

Entretanto, se considerada meramente como signo, a linguagem também pode perder seu caráter de função enquanto evento. Consequentemente, a linguagem torna-se instrumental. "Ela pode ser exprimida como princípio fundamental de que cada vez que as palavras assumam una mera função de signo, a conexão original entre falar e pensar, com a qual nos preocupamos se transforma em relação instrumental" (Gadamer 1995, p. 433). Pretendo argumentar que é isso precisamente que ocorreu com a maneira como a ciência moderna tentou explicar a Natureza.(...)

O verdadeiro ser da linguagem só pode estar presente na conversação, unicamente presente no "vir-à interpretação". Essa, então, é a forma mais fundamental de compreender a Natureza em termos não instrumentais, mas como algo que emerge à superfície na nossa hermenêutica do ouvir. O compreender "é um processo vivo em que a comunidade da vida existe" (Gadamer 1995, p. 446). (...)
O evento verbal significa que tanto nós mesmos quanto as coisas são preservados e alterados na linguagem. Nem nossa relação nem a interpretação que fazemos da Natureza são estáticas, como formularam Descartes, Galileu e Newton. (...)

Não devemos buscar sair da Natureza para transformá-la em objeto de compreensão, pois tal objetificação foi precisamente o que Descartes buscou fazer. É assim que ocorre o objetivismo das ciências naturais pós-cartesianas. Pois nossa experiência de mundo é verbal, assim como nossa experiência com a Natureza também é verbal e emerge do diálogo. (...)
Geralmente a ciência tem definido tudo que "supostamente exista em si mesmo" numa tentativa de garantir o controle do homem sobre todas as coisas e especialmente sobre a Natureza. Na verdade, o conhecimento nas ciências naturais é de fato o conhecimento a bem do controle e da dominação. (...)
Dessa forma, pode-se argumentar que, precisamente por essas razões, é equivocado o objetivo do mundo da ciência de conter a totalidade de tudo que existe.


A objetificação da ciência já considera a linguisticidade de uma experiência natural do mundo expresso na linguagem enquanto fonte de pré-concepções. A ciência efetua transgressões com métodos precisos de medição matemática para compensar as pré-concepções da linguagem. Desse modo, a ciência torna-se ferramenta por meio da qual a uniformização das experiências é realizada como passo no sentido do controle e da dominação das coisas e, por sua vez, da transformação da Natureza. Na própria natureza das questões formuladas e no seu processo investigativo, a ciência moderna busca controlar tudo que existe para assim ser vista como práxis e não teoria. Essas teorias são dominadas pela noção de construção de um sistema — isto é, "o conhecimento teórico é em si concebido em termos da vontade de dominar o que existe, é um meio e não um fim" (Gadamer 1995, p. 454).

Trecho do meu livro "Em Busca da Dimensão Ética da Educação Ambiental"
Mauro Grün - Doutor em Ética e Educação Ambiental pela University of Western Australia